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segunda-feira, 1 de março de 2010

Samba triste



Nunca escrever foi tão necessário, e tão difícil. Queria mesmo era conseguir compor um samba. Um samba triste, um samba de saudade, e como já dizia Baden Powell (que Deus o tenha):

“ Samba triste agente faz assim, eu aqui, você longe de mim, alguém se vai, saudade vem”.

E hoje acordei com o aperto de saudade, foi como se depois de toda a cerimônia, todas as lágrimas derramadas, o cortejo e o enterro, agora que a ficha começou a cair. E no momento em que a vida continua para todos nós, continua mais triste, faltando um pedaço. A música perdeu um grande instrumentista, a companheira um grande homem, filhos perderam um grande pai, os netos um avô alegre, risonho e bigodudo, e para o resto houve a perda de um grande amigo, um mestre do samba e da vida. Nosso querido Zazá partiu,"numa batucada de bamba", juntamente com outro sambista no Rio, o Walter Alfaiate, eles foram inclusive enterrados no mesmo horário, e aposto com quem quiser, que Deus não economizou no samba de recepção pros dois, lá em cima. Ajuda era que não faltava, lá devia estar o cartola, o Jamelão, o Baden Powell, e essa turma toda ... zazá deve estar se esbaldando!

O ruim da partida é pra gente que fica aqui, meio que abandonado, sem saber como vai ser de agora pra frente. Mas Zazá foi esperto, ele sabia que ninguém era eterno, e durante toda sua vida ele pregou, ensinou o que sabia de samba, de cadência. E agora os aprendizes estão aí, uma geração de sambistas talentosos, que aprenderam tradicionalmente na roda, na noite, sentado, olhando para as suas mãos firmes e precisas. Mãos estas que estavam geladas ontem, e ele estava sem bigode, mas usava a blusa predileta, e um broche de pandeiro. Coroas de flores do clube do choro, do samba da madrugada, de seus familiares, chegavam e perfumavam o ambiente. Homenagens de seus amigos músicos emocionavam a todos nós. Foi-se a despedida. Dedos trêmulos tocavam carinhoso no acordeon, violão e pandeiro. Lágrimas doces corriam dos olhos de todos, e na tristeza comungamos.

Hoje sinto-me privilegiada de ter tido a oportunidade de conhecer, conviver, aprender, e ser amiga dessa figura fantástica, que fez história, e deixou saudade.


Zazá hoje foi embora

Não há do que se lamentar

Ele teve que partir

Mas eu sei que aprendi

O que ele veio me ensinar


Hoje agora ele faz festa

E ensina quem já foi

Hoje o céu samba depressa

Com a chegada deles dois


Só não fica chateado

Pelo bigode cortado

Pois seu pandeiro

Aqui embaixo

Nunca será calado


Daniela Machado